segunda-feira, 3 de novembro de 2008

Números e saudades.

Cinco anos são mil oitocentos e vinte e sete dias. 1827. Parece pouco ou parece muito? São vinte e cinco vezes setenta e três dias. 73 não é um número aleatório, mas o que ele significa não importa.

Vinte e cinco vezes setenta e três. Mil oitocentos e vinte e sete. Cinco anos.... De acordo com o Google Maps, a distância entre a cidade onde moro e Olinda (PE) é de dois mil duzentos e treze quilômetros. 2213. Escrevo por extenso porque numéricamente parece pouco, sabe? De carro, um dia e duas horas; vinte e seis horas. O que são vinte e seis horas em mil oitocentos e vinte e sete dias? Pfff... Nada...

O litro de gasolina, hoje, custa aproximadamente dois reais e trinta e sete centavos (R$2,37). Pra percorrer 2213km, seriam necessários (com um carro popular pelo menos) cento e cinquenta e nove litros de gasolina. Isso é 159 vezes R$2,37. Aproximadamente trezentos e setenta e sete reais. R$377,00 é pouco. Mas eu não tenho um carro popular. Eu sequer tenho um carro. Não tenho nem CNH! Não adianta.

E de avião? Uns R$37,00 até o Rio de Janeiro de ônibus, pra pegar um voô pra recife que custa R$619,00. De Refice à Olinda de ônibus, mais uns R$20,00 no máximo, acredito eu. R$676,00 a ida. Mil trezentos e cinqüenta e dois reais pra ir e voltar. R$1352,00. Fora das minhas possibilidades num primeiro momento mas em 1827 dias, talvez eu conseguiria juntar esse dinheiro, pouquinho à pouquinho...

Anyway, eu tenho pernas. O Google Maps avisa: "Seja cuidadoso – Esta rota pode não ter calçadas ou caminhos de pedestres." Bah, eu me viro. Quatro mil seiscentos e oitenta e quatro quilometros a pé. 4684km... 39 dias e 19 horas. Novecentas e cinquenta e cinco horas. Parando pra comer, dormir, e trocar de sapato (porque ninguém merece) no máximo umas mil e duzentas horas. 50 dias. Ainda pouco comparado à 1827.

Eu poderia ter pensado nisso tudo antes. Nunca pensei.
Nunca pensei.

A gente nunca pensa em matemática, assim. A maioria das pessoas pelo menos...
A matemática, às vezes, não serve pra bosta nenhuma. A geografia não serve pra bosta nenhuma. A geografia serve pra diminuir à insignificantes e triviais conversas ao telefone, todo o amor e a saudade que ficam separados por 2213 ou 4684km.

De um lado do telefone à nossa impotência de quem não acha suficiente os "alôs", os "e a vida, como vai" e os sinceros "morro de saudades à cada dia". Não, não são suficientes. Se fosse o Rogério Flausino ele diria: "a obrigação da sua voz é estar aqui". Não fosse a distância ela estaria. Sempre.

Tem coisas que a gente não controla. O tempo, a distância. Mesmo que no vestibular alguma trick question qualquer diga que a globalização encurta os dois. Mentira! Dinheiro, possibilidades, sorte... eles sim, talvez encurtem os dois.

Números, números, números por extenso, números numéricos, números numerais, números. Matemática, geografia, filosofia de boteco e luto. Luto.

Saudade. 1827 dias, que poderiam não significar nada se eu tivesse um a mais. Unzinho a mais. Não tive.

A saudade de 1827 dias - durante os quais não me esqueci um segundo de você - parecia remediável até hoje de manhã. Não é mais. Agora vou carregá-la por mais 1827, e depois mais 1827, e outros 1827, e essa sequencia de 1827s vai ser eterna, como é eterna a seqüencia dos 73, que eu já disse no início que o significado não importa.

Tem uma letra a mais no meu nome, tem uma letra a menos no seu. "Life goes on". Existem o trabalho, as obrigações, os cafés da manhã, os banhos, os sábados, os domingos, as notícias nos jornais, o pão, o leite, o pijama, o par de meias, o ficar de pé.

Mas também existe, inevitável e irremediávelmente, a dor.

Eu te amo. Amo, amo e amo. E amo mais. E se multiplicares todos esses números inúteis aí em cima, não vais chegar à um milésimo do resultado. É amor de sangue, mas mais que isso, é amor de amor.

E, antes de me despedir, posso pedir um favor?
Diz ao meu pai que eu me lembro, sempre.
E, se por acaso, esbarrar em Drummond, diz à ele que agora entendo o que é ver a mesa vazia.

Vai em paz.

2 comentários:

Priscila disse...

A matemática, por vezes, serve para nós tentarmos contabilizar em vão a infinita saudade que sentimos de alguém.. Q sua pessoa querida vá em paz, e que vc fique em paz por aq tb.. =]

Sobre a foto.. foi tirada na Prainha (Barra de São João/RJ)

Boa semana.
BjoKs.

Anônimo disse...

Caramba. Terminei de ler agora teu texto. Li o texto com uma paixão e uma solidariedade incríveis.

Distâncias... o que fazer com elas? pra que elas servem afinal?
Quem sabe, se nesse jogo de sorte ou azar, o lado da moeda que escolheste não cai? Te desejo sorte. Ou acasos como a verificação de palavras de teu blog agora: prece (com grafia de pressess, mas isso nao importa), que pode ser a tua de encurtar essa distancia.
bjo


(vou te linkar lá no blog tá?)