terça-feira, 11 de novembro de 2008

Dadaísmo - II

Daí eu tive esse sonho:

Estava com o John Frusciante na fila do Bob's. Na nossa frente, a Melissa Auf der Maur. Ela pediu e foi pro lado, assim, esperar sua bandeija. O caixa era japonês, mal humorado e andava com uma mochila nas costas. Chegou o lanche da Melissa e eu fui (daquele jeito mecânico de fila de fast food) pegar uma batatinha, quando o Frusciante pegou no meu braço e disse: Anna! Esse não é o nosso!

Eu acordei.
Nada no meu livro sobre significados de sonhos explica isso.
Boa noite.

segunda-feira, 10 de novembro de 2008

O primeiro clichê.

"Somethings never change."

É.

... outras, inevitávelmente o fazem. O ponto de ônibus foi cruelmente derrubado, as mesas da pracinha (assim como a pracinha) não são mais as mesmas. Nossa quadra, ainda que sem água, virou uma piscina. Filhos, quadros, apelidos, letras. Caixabaixa. Caxabaxa. "Lembra?" O trema e o hífen!; já não sei mais o que fazer com eles... E gosto musical?... Os furos na orelha do Rob Thomas aliados aos fantásticos solos do Santanna... O Mickey, o Geraldo, o coelho.

Hoje eu falo inglês, e você? Nunca vi Stuart Little 2. Entre poemas, famílias e Natalie-Portman's, tem um mp4 ligado. Nele, não toca Adam Duritz. Nem Alexandres (ou Diegos - tantos - santos, falsetes, navarros.)

É, tem coisa que muda, e muito. Tem coisa que muda pra bom, e tem coisa que... ué! Mas toda mudança é boa, Ana Cláudia! Anna Duzzi. Russos renatos, papas polacos, nomes de vodkas que aos 13 anos não conseguíamos comprar. Perguntas, respostas, famílias, udora. Apriori é junto ou separado? Italiano ou francês?

Mas, sabe?...! Cola de isopor tem o poder, assim, de deixar algumas coisas como estão. O bico de pato atropelado, o sotaque, os palavrões, as pulseiras, os telefones e a voz dos pais que expulsam os filhos de casa.

Somethings never change. True.
O gosto, as fotos, os dedos, a memória... Ah! Roubando as palavras alheias: "Ainda bem que they never do" (:

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quinta-feira, 6 de novembro de 2008

Eram duas em uma. Agora não mais.

Eu costumo decorar frases de filmes que gosto muito, assim, sem querer. Sabe-se lá porquê...
Fato é que vez ou outra elas caem como uma luva...

(...)
Garota loira, de 13 anos, vestido preto do lado da samambaia....
Garota loira, de 13 anos, vestido preto do lado da samambaia....
(...)

Eram quase 4 da manhã e não havia vestido preto ou samambaia. O cabelo era castanho, um castanho que encobria um arco-íris... Enquanto eu ainda tinha os olhos fechados (porque eu me recusava à abrí-los - como sempre - literal e figurativamente) veio de repente à minha cabeça a voz ainda infantil da Mischa Barton, quando ela diz em "Lost & Delirious":

"Have you ever been really thirsty? And you open a carton of milk, and you pour it in your mouth... and it's... sour? That happened inside of me... forever."

Era isso. Era isso que eu carregava aqui dentro, carregava sem saber e sem precisar. Mesmo crescendo, mudando, me apaixonando, vivendo, amadurecendo, e todos os gerúndios do mundo, tinha algo preso aqui dentro de mim; e tinha gosto de leite azedo.

Eu abri os olhos, olhei ao redor; o relógio fazia seu barulhinho que só se ouve de madrugada, o mundo estava apagado e minha sala acesa, as flores que eu havia esquecido de regar estavam ali e o telefone continuava na minha mão. Foi no momento em que eu soltei o telefone, apaguei a luz da sala e vim pelo corredor em direção à minha cama que eu percebi minha vantagem sobre a Mischa Barton: na minha frase não havia "forever".

Eu ri. Ri de mim, do filme, da metáfora do leite... eu ri. Eu ri! E quando eu ri, eu fiz 20 anos.
Eu vi a menina de 13 anos, com luzes no cabelo e esmalte preto na unha do pé (dessa vez sem samambaia) sorrir pra mim de volta. E acenar, se despedindo, fading away.

Sete anos...

Eu me deitei mais leve, e minha boca (e minha alma) agora tinham gosto de... bala de hortelã. Ou chiclete de melancia, tanto faz.

Aliás, é isso, sabe? Tanto faz.
Mas ela não percebia isso, enquanto insistia em morar nos seus eternos 13 anos.

Agora ela sabe. Agora EU sei.
O David - cara legal - disse rindo, super simpático: - Sorry, wrong number.
Agradeci.

Agradeci e pensei: It's ok.
Pode acreditar, tá tudo bem de verdade. It doesn't matter anymore.
Demorou, demorou muito. Mas eu cresci. Cresci sete anos em dez minutos. Até dormi de barriga pra cima.


Brigada. De verdade. Por tudo. E vai ser feliz!... (:

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

Num espaço de três minutos - I

Fuma-se um cigarro num espaço de três minutos?

2:57 da manhã.

Ela abriu as cortinas, as venezianas e os vidros da janela. Chovia (como chovia toda noite, há semanas) mas ela não queria sua casa - que era quase um cômodo só - fedendo à cigarro. Pegou a taça de vinho e sentou-se no parapeito. Não era muito alto. Com o cigarro na boca e o isqueiro na mão, pensou. Por 4 ou 5 segundos, pensou. Riu, e acendeu. Soltava a fumaça tentando fazer bolinhas. A chuva molhava a perna que havia ficado pro lado de fora. Ela não se importava. Uma golada, uma tragada, uma loucura. Passaram-se dois minutos e quarenta e três segundos. Parecia tão mais... Olhou para o cigarro - já quase no filtro - e sorriu. Deu a última tragada.

- Aviso! - disse para ninguém, apagando a ponta no parapeito molhado.

E voltou pra cama às 3:00 da manhã naquela madrugada menos vazia.

Números e saudades.

Cinco anos são mil oitocentos e vinte e sete dias. 1827. Parece pouco ou parece muito? São vinte e cinco vezes setenta e três dias. 73 não é um número aleatório, mas o que ele significa não importa.

Vinte e cinco vezes setenta e três. Mil oitocentos e vinte e sete. Cinco anos.... De acordo com o Google Maps, a distância entre a cidade onde moro e Olinda (PE) é de dois mil duzentos e treze quilômetros. 2213. Escrevo por extenso porque numéricamente parece pouco, sabe? De carro, um dia e duas horas; vinte e seis horas. O que são vinte e seis horas em mil oitocentos e vinte e sete dias? Pfff... Nada...

O litro de gasolina, hoje, custa aproximadamente dois reais e trinta e sete centavos (R$2,37). Pra percorrer 2213km, seriam necessários (com um carro popular pelo menos) cento e cinquenta e nove litros de gasolina. Isso é 159 vezes R$2,37. Aproximadamente trezentos e setenta e sete reais. R$377,00 é pouco. Mas eu não tenho um carro popular. Eu sequer tenho um carro. Não tenho nem CNH! Não adianta.

E de avião? Uns R$37,00 até o Rio de Janeiro de ônibus, pra pegar um voô pra recife que custa R$619,00. De Refice à Olinda de ônibus, mais uns R$20,00 no máximo, acredito eu. R$676,00 a ida. Mil trezentos e cinqüenta e dois reais pra ir e voltar. R$1352,00. Fora das minhas possibilidades num primeiro momento mas em 1827 dias, talvez eu conseguiria juntar esse dinheiro, pouquinho à pouquinho...

Anyway, eu tenho pernas. O Google Maps avisa: "Seja cuidadoso – Esta rota pode não ter calçadas ou caminhos de pedestres." Bah, eu me viro. Quatro mil seiscentos e oitenta e quatro quilometros a pé. 4684km... 39 dias e 19 horas. Novecentas e cinquenta e cinco horas. Parando pra comer, dormir, e trocar de sapato (porque ninguém merece) no máximo umas mil e duzentas horas. 50 dias. Ainda pouco comparado à 1827.

Eu poderia ter pensado nisso tudo antes. Nunca pensei.
Nunca pensei.

A gente nunca pensa em matemática, assim. A maioria das pessoas pelo menos...
A matemática, às vezes, não serve pra bosta nenhuma. A geografia não serve pra bosta nenhuma. A geografia serve pra diminuir à insignificantes e triviais conversas ao telefone, todo o amor e a saudade que ficam separados por 2213 ou 4684km.

De um lado do telefone à nossa impotência de quem não acha suficiente os "alôs", os "e a vida, como vai" e os sinceros "morro de saudades à cada dia". Não, não são suficientes. Se fosse o Rogério Flausino ele diria: "a obrigação da sua voz é estar aqui". Não fosse a distância ela estaria. Sempre.

Tem coisas que a gente não controla. O tempo, a distância. Mesmo que no vestibular alguma trick question qualquer diga que a globalização encurta os dois. Mentira! Dinheiro, possibilidades, sorte... eles sim, talvez encurtem os dois.

Números, números, números por extenso, números numéricos, números numerais, números. Matemática, geografia, filosofia de boteco e luto. Luto.

Saudade. 1827 dias, que poderiam não significar nada se eu tivesse um a mais. Unzinho a mais. Não tive.

A saudade de 1827 dias - durante os quais não me esqueci um segundo de você - parecia remediável até hoje de manhã. Não é mais. Agora vou carregá-la por mais 1827, e depois mais 1827, e outros 1827, e essa sequencia de 1827s vai ser eterna, como é eterna a seqüencia dos 73, que eu já disse no início que o significado não importa.

Tem uma letra a mais no meu nome, tem uma letra a menos no seu. "Life goes on". Existem o trabalho, as obrigações, os cafés da manhã, os banhos, os sábados, os domingos, as notícias nos jornais, o pão, o leite, o pijama, o par de meias, o ficar de pé.

Mas também existe, inevitável e irremediávelmente, a dor.

Eu te amo. Amo, amo e amo. E amo mais. E se multiplicares todos esses números inúteis aí em cima, não vais chegar à um milésimo do resultado. É amor de sangue, mas mais que isso, é amor de amor.

E, antes de me despedir, posso pedir um favor?
Diz ao meu pai que eu me lembro, sempre.
E, se por acaso, esbarrar em Drummond, diz à ele que agora entendo o que é ver a mesa vazia.

Vai em paz.

domingo, 2 de novembro de 2008

Na praia do forte, em Cabo Frio

Era uma dessas tardes comuns em cidade de praia. Bem no meio de maio, não havia feriado, não havia multidão, o sol não estava escaldante e nada nesse mundo a faria concordar em passar filtro solar. Tinha lá seus dois aninhos; três, no máximo. Pequenininha, dentro de uma dessas piscininhas infláveis redondinhas onde parece não caber nada. Ela cabia; ela e um tiquinho de água do mar, que de tempos em tempos ela colocava na boca escondido e depois cuspia, fazendo essas carinhas de nojo típicas de criancinhas de dois anos, três no máximo.

Do lado, estava a mãe. Deitada, tomando sol, aparentemente despreocupada - não fosse o fato de ela sentar-se à cada dois minutos, botar a mão na testa, daquele jeito pra tapar o sol, olhar a pequena e dizer sorrindo: "ah, menina!". ("Ah, menina" porque ela ficava jogando água pra cima, no auge de sua diversão, e vez ou outra uns respingos atingiam a mãe). Teve a hora em que ela jogou água pra cima bem na hora que a mãe abria a boca pra morder uma coxinha... Xiii! Na mesma hora se encolheu toda na piscininha deixando só os olhinhos de fora; a mãe, com cara séria, fez silêncio; virou-se para um homem grande (que sorria o tempo todo, e que havia trazido a coxinha) e disse:

- Cláudio, olha ela aí que vou no quiosque comer.

Ele chegou mais perto da piscininha amarela (é, era amarelinha) e cochichou algo no ouvido da pequena, que logo se desencolheu sorrindo e estendendo os bracinhos pra cima. Ele à pôs no colo.
Eu estava ali, observando de "meio-longe-meio-perto". Não os conheço, não sei o nome da mãe, não sei o nome do projetinho de gente, sei - se não estiver enganada quanto ao que ouvi por culpa do barulho das ondas - o nome do homem grande. Deve ser o pai. Dá pra ver pelo carinho que tem com ela, apontando e mostrando tudo, balançando as pernas e a fazendo sorrir. Os olhinhos pequenininhos e redondinhos dela brilhavam de amor, de admiração; uma admiração inconsciente para com aquele homem grande que a mostrava o mundo. Não sei se ela mesma entendia esse amor que sentia, mas os olhinhos dela continuavam brilhando.

Houve uma hora em que olharam na minha direção. Eu sorri. A mãe chegou com alguém, que apertou a bochecha da menina e cumprimentou Cláudio. Levantaram-se e a colocaram de volta na piscininha dela, que agora não tinha mais tanta graça. Ela ficava de pé, tentando ser vista pelos três gigantes, que - também de pé - conversavam, gesticulando e sorrindo.

Eu voltei para meu sol. Só olhei de novo quando ouvi uma voz dizendo "vamo levá ela no mar!" (era o amigo, falando). Ela se encolheu de novo na piscina, como que querendo se esconder. Cláudio se abaixou e disse:

-Vamo, 'fiota'. Não tem perigo.

E pegou de um lado da piscina. O amigo pegou do outro. Levantaram-na.

Até hoje não sei bem o porquê, mas resolvi me levantar e seguí-los; queria ver no que ia dar. Ela estava lá, ainda encolhida. As mãozinhas seguravam firme nas bordas da pequena piscina inflável amarela. Metade da cabecinha pra fora, olhando pra baixo. Via os pés do pai, via os pés do amigo dos pais, via o chão... o chão.

Quando um restinho de onda alcançou os pés dos homens ela falou. Foi a primeira vez que a ouvi falar. Ela disse, com uma vozinha de medo misturada com confusão, olhando para o pai: "Chão de água!"

Chão de água. Ela não entendia como, tão de repente, o chão tinha virado "de água"...
Ela não parecia gostar muito do chão de água, então a levaram de volta (agora com um pouquinho mais de água no seu mar amarelinho particular).

Eu aproveitei que estava no chão de água e dei um mergulho. Um só. Confesso que também não gosto muito do chão de água; com 20 anos sequer sei nadar... Saí da água, juntei minhas coisas e antes de ir embora sorri para a família, dando um tchauzinho pra pequenininha. Pude ouvir o Cláudio dizer enquanto apontava pra mim "dá tchau pra moça oh" e mostrava como se fazia despedindo-se de mim. Sorri pra ele. Naquele momento, eu queria guardar o filme dessa tarde comigo pra sempre...

Alguém me cutucou, eu estava quase esquecendo meu óculos de sol. Agradeci, guardei na bolsa e quando olhei de volta eles estavam lá, na realidade deles, no fim de tarde deles, na conversa deles; e ela - jogando água pra cima no auge de sua diversão. Não fitei por muito tempo, peguei meus chinelos sujos de areia e rumei pra casa.

Cláudio. Chão de água. A menina em sua piscininha amarela... Não vou me esquecer nunca.

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